Pra começo de conversa...
A
Bíblia é uma grande biblioteca (o termo Bíblia é o plural da palavra grega
bíblion (= livro) e significa originalmente “os livros”). Algumas pessoas
chegam a pensar que a Bíblia seja resultado do trabalho de um único autor. Na verdade,
são muitos livros, muitos autores e épocas diferentes. Por isso, para ler a
Bíblia é preciso ter um olhar no passado (por onde passa a chamada antiga
aliança), no presente (onde se atualiza a nova aliança) e no futuro (na
esperança do tempo escatológico que corta tanto a antiga como a nova aliança).
A partir daí surge uma
pergunta: quem é o autor da Bíblia?
Deus
é o autor da Sagrada Escritura: por meio do documento
conciliar chamado Dei Verbum[1]
a Igreja afirma que tudo o que está escrito em toda a Sagrada Escritura é de
inspiração divina, portanto, tem Deus como autor, “Na redação dos Livros Sagrados, Deus escolheu homens, dos quais se
serviu fazendo-os usar suas próprias faculdades e capacidades, a fim de que,
agindo Ele próprio neles e por meio deles, escrevessem como verdadeiros
autores, tudo e só aquilo que ele próprio queria” (Dv 11).
O
homem é também autor na medida em que escreve sob inspiração divina: Cada
pessoa no seu contexto histórico expressou de maneira fundamental a revelação
que Deus quis que estivesse ao alcance dos homens e mulheres de todos os
tempos, de modo que essa revelação se torna “História da Salvação”. Cada pessoa
escreve a partir do lugar, da cultura, da realidade sócio-política, econômica e
religiosa presente no seu tempo e que o influencia na hora em que esse autor
vai escrever o seu livro. Mas como tudo o que os autores sagrados afirmam é de
inspiração do Espírito Santo “deve-se
professar que os livros da Escritura ensinam com certeza, fielmente e sem erro
a verdade que Deus em vista da nossa salvação quis fosse consignada nas
Sagradas Escrituras” (DV 11). E é bom dizer que por causa dessa influencia
contextual, em alguns lugares da Escritura encontramos informações
principalmente de caráter histórico e geográfico que apresentam erros. Por
exemplo: o Evangelho de Marcos começa atribuindo ao profeta Isaías uma citação
do profeta Malaquias (Mc 1,2)! A diferença do número de exilados de Judá, 4.600
conforme Jr 52,30, em vez de 18.000 conforme a contagem de 2Rs 24,14-16. E isso
quer dizer o que? Que a Bíblia não diz a verdade? Claro que não! O importante é
a verdade religiosa que se abre em todo Livro Sagrado. Quando se afirma que
Deus inspirou o autor sagrado não quer dizer que ele tomou a caneta das mãos do
hagiógrafo e escreveu de seu próprio punho. Isso seria uma visão ingênua. Ele
inspira o autor a partir da sua própria experiência religiosa e esse por sua
vez expressa aquilo que Deus quer manifestar ao povo. Ouvi uma vez um grande
exegeta dizer: “O homem escreve no papel e Deus na vida”.
A tradução da Bíblia
A
Bíblia foi escrita originalmente em três línguas. O AT em hebraico e alguns
textos em aramaico. Os últimos textos do AT foram escritos em grego, que era a
língua usada nas comunidades da diáspora, onde se encontrava comunidades de
judeus, fora da terra de Israel. O NT foi todo escrito em grego.
Das
antigas traduções temos dois grandes grupos: as de origem judaica (Pentateuco samaritano e a tradução dos
Setenta) e de origem cristãs (vulgata).
Septuaginta:
quando, no Séc. IV a.C, Alexandre Magno conquistou o antigo império Persa
(inclusive a Palestina), a língua oficial tornou-se o grego. Muitos judeus, não
apenas na diáspora, como também na própria Palestina, passaram a falar o grego.
Foi, sobretudo, na importante cidade de Alexandria, no Egito, que a colônia
judaica mais assimilou a cultura helenística. No Séc. III a.C, os judeus de
Alexandria, incentivados pelo rei egípcio Ptolomeu II, começaram a traduzir a
bíblia para o grego. Costuma-se dizer, que isso ficou na responsabilidade de 70
sábios, de onde seu nome: Septuaginta ou Setenta (sigla LXX).
Vulgata: No
Séc. IV d.C, o imperador Constantino se converteu ao Cristianismo, e em 390
d.C, o imperador Teodósio proclamou o Cristianismo religião oficial do Império
Romano. Com isso, tornou-se religião das massas populares, também na Europa
Ocidental (Itália, Espanha, Gália/França) e na África setentrional onde a
língua popular era o latim. Impo-se a necessidade de traduzir a Bíblia para o
latim. A pedido do Papa, o teólogo romano São Jerônimo fez uma tradução
integral da Bíblia para o latim chamada Vulgata. Depois do Concílio Vaticano II
a Igreja Católica publicou a Nova Vulgata, que é o texto oficial da Igreja.
As grandes traduções da
atualidade: Bíblia Matos Soares, Bíblia
do Pontifício Instituto Bíblico, a Bíblia de Jerusalém, Bíblia Sagrada – Edição
Pastoral e Bíblia do Peregrino.
A
pergunta é: qual a melhor tradução? É aquela que atende a necessidade do
leitor. Por exemplo: para uma leitura popular da Bíblia, em grupos de reflexão,
círculos bíblicos, grupos de oração pode-se usar a Bíblia Sagrada – Edição
pastoral, a tradução da CNBB ou até mesmo a tradução da Ave Maria. Já o leitor
que quer aprofundar o seu conhecimento da Palavra de Deus, pode ler a Bíblia de
Jerusalém, a TEB (Tradução Ecumênica da Bíblia) ou a Bíblia do Peregrino,
porque além de se traduzidas do texto original nos oferecem mais recursos de
pesquisa.
O Cânon da Bíblia
O Cânon da Bíblia
Dá-se
o nome de Cânon (do grego Kanón = regra, medida) a lista ou catálogo dos livros
sagrados que são considerados pelos judeus e cristãos como inspirados por Deus.
-
Canônico = livro catalogado – o que implica que seja inspirado.
-
Protocanônico = livro catalogado em 1º lugar ou aceito no 1º cânon.
- Deuterocanônico = livro catalogado posteriormente.
-
Apócrifos = livro não lido nas assembléias públicas de culto por não terem sido
aceitos na relação dos livros sagrados, reservado a leitura particular. Durante
muito tempo foram rejeitados, mas agora se vê como são valiosos para a história
do Cristianismo. Neles podem conter proposições verdadeiras que não foram
acolhidas pelos autores sagrados. Através dessas obras se vê o modo de pensar
de judeus e cristãos daquela época.
Capítulos e versículos
Durante
muito tempo não houve qualquer divisão em capítulo ou versículo. O próprio
Jesus quando encontra-se na sinagoga (Lc 4,16-28) toma o rolo em suas mãos e ao
abrir encontra o texto do profeta Isaías. Continuava-se o texto em cada
encontro sinagogal até se concluir toda a leitura da Lei, e a única divisão era
a dos livros conforme o costume. A divisão em capítulos só se deu em 1228 e em
versículos em 1559, no início da modernidade. Dependendo da tradução podemos
encontrar diferenças quanto aos capítulos e versículos, sendo que a nossa
principal preocupação deve ser com o sentido do texto. Essa divisão colabora na
leitura litúrgica nas igrejas e pode ajuda o leitor a encontrar sem maiores
dificuldades o texto que está procurando. Vamos ver um exemplo:
Mt 5,1. Mt é a abreviatura do Evangelho de Mateus. O que
vem antes da vírgula é o capítulo e depois da vírgula o versículo. A vírgula
separa o capítulo do versículo.
Às vezes você encontra a citação dessa forma: Mt 5,1-12
ou Mt 5-7. O hífen indica a seqüência de capítulos ou versículos. Esse exemplo
você lê assim: Evangelho de Mateus capítulo 5, dos versículos 1 ao 12 e
Evangelho de Mateus capítulo 5 ao 7.
O ponto e vírgula é outro sinal usado. Ele pode separar
tanto livros da Bíblia como capítulos. Exemplo: Mt 5,1-12; Lc 6,12-16. O ponto
e vírgula separam uma citação do Evangelho de Mateus de uma do Evangelho de
Lucas. Pode ser também assim: Mt 5,1-12; 10,1-11. Nesse exemplo, o capítulo 5,
versículo do 1 ao 12 está separado do capítulo 10, versículo do 1 ao 11. Quando
vamos ler já se sabe que a leitura se refere só aos capítulos e versículos a
qual alude à citação.
O ponto separa versículo de versículo. Por exemplo: Mt
5,1-12.16. Isso significa que além de ler os versículos de 1-12, eu também vou
ler o versículo 16.
Como devemos ler essa citação? Mt 5,1-12.16-48; 7,21-22.
Evangelho de Mateus capítulo 5, versículo de 1 ao 12, depois os versículos de
16-48. Em seguida ler o capítulo 7, do versículo 21 ao 22.
Quando encontramos uma letra (a ou b) depois de um
versículo, isso significa que estamos citando apenas a primeira parte (a) ou a
segunda parte (b) desse versículo.
Às
vezes depois da citação de um versículo você pode encontrar um “s” ou “ss”.
Isso significa que são citados um ou mais versículos logo depois. Por exemplo:
Mt 5,1s. Você vai ler só o versículo 1 e 2.
[1]
Esse documento trata do tema da Revelação divina e se tornou um importante
instrumento da chamada renovação bíblica. É um dos documentos do Concílio
Vaticano II (1962-1965).
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