A Bíblia é dividida em duas partes: a primeira costuma-se
chamar de Antigo Testamento e a segunda de Novo Testamento.
A palavra testamento, no hebraico Berît significa aliança, pacto; no grego diatheke, testamento, contrato. Toda a Sagrada Escritura é uma
aliança entre Deus e o seu povo e essa é a melhor forma de compreender a
pedagogia divina, “Tomar-vos-ei por meu povo, e serei o vosso Deus” (Ex 6,7).
A começar pela criação, a aliança de Deus se manifesta
através de toda obra criada testemunho da vontade do Criador que quer que o
homem e a mulher se realizem como pessoa. Apesar do pecado de nossos primeiros
pais, Deus não deixou de renovar a sua aliança através de Noé, Abraão, Isaac e
Jacó, Moisés, os profetas até chegar a Jesus, Palavra de Deus, força de Deus
para a salvação de toda pessoa, nova aliança e centro do Antigo e Novo
Testamento.
As nossas traduções da Bíblia contêm sete livros a mais
que as traduções protestantes. Para explicar essa diferença é preciso dizer que
já antes de Cristo existiam duas versões da Bíblia do Antigo Testamento: a
original de língua hebraica e uma tradução de língua grega, que era lida nas
comunidades judaicas que num processo de inculturação, passaram a falar o
grego. Os primeiros cristãos, na sua grande maioria, judeus de língua grega,
liam as Sagradas Escrituras na tradução que ficou conhecida como Septuaginta.
Todo o Novo Testamento foi escrito em grego.
No fim
do séc. I, depois de expulsar os cristãos de suas sinagogas, as autoridades do
Judaísmo, chegaram a um consenso e aceitaram só os livros do original hebraico.
Nessa época circulava alguns livros que haviam sido escritos no grego (Jt, Tb,
1/2 Mc, Sb, Eclo e Br mais alguns fragmentos de Est e Dn) e que foram aceitos pelos
cristãos como inspirados.
Por
ocasião da reforma protestante, Martinho Lutero adotou a mesma linha das
autoridades judaicas quanto ao AT mesmo seguindo a Bíblia grega (e latina)
quanto à ordem dos livros. A justificativa católica quanto ao problema se dá
porque esses sete livros faziam parte da Bíblia dos primeiros cristãos. Por
causa da discussão em torno da canonicidade dos livros esses sete livros
ficaram conhecidos como deuterocanônicos (aceitos como inspirados num segundo
momento). O Quadro a seguir mostra os livros da Bíblia na sua totalidade:
Antigo
Testamento (com base na LXX) Grifo: livros deuterocanônicos – recusados por
protestantes/[grifo]: recusado por protestantes e católicos
|
Novo Testamento (católicos e
protestantes)
|
Livros
históricos
Gn, Ex, Lv, Nm, Dt
Js
Jz
Rt
1/2 Rs (=1/2 Sm)
3/4 Rs (=
1/2 Rs)
1/2
Paralipômenos (= 1/2 Cr)
[1 (ou 3)
Esd]
2 Esd (Esd/Ne)
Est (+
fragmentos deuterocanônicos 10,4-16,24)
Jt
Tb
1/2
Macabeus
[3/4
Macabeus]
|
Livros
sapienciais
Sl
[Odas]
Pr
Ecl
Ct
Jó
Sb
Sr
[Salmos de
Salomão]
|
Livros
proféticos
Is
Jr
Lm
Br/carta de Jeremias
Ez
Dn (+
fragmentos deuterocanônicos 13-14)
12 profetas menores
Os, Am, Mq,
Jl, Ab, Jn, Na, Hab, Sf, Ag, Zc, Ml
|
Evangelhos
e Atos
Mt, Mc, Lc,
Jo
Cartas
Paulinas
Rm, 1/2
Cor, Gl, Ef, Fl, Cl, 1/2 Tm, Tt, Fm, Hb
Cartas
Católicas
Tg, 1/2 Pd,
1/2/3 Jo, Jd
Apocalipse
|
A
Bíblia judaica (que nos chamamos de Antigo Testamento) possue 24 livros
divididos em três grupos:
T – Torá, a lei (de Moisés);
N – Nebiîm, os profetas:
- anteriores;
- posteriores;
k – Ketubîm, os escritos.
O Antigo
Testamento
“Deus amantíssimo, desejando e preparando
com solicitude a salvação de todo o gênero humano, escolheu por especial
providência um povo a quem confiar as suas promessas. Tendo estabelecido
aliança com Abraão (cf. Gn. 15,18), e com o povo de Israel por meio de Moisés
(cf. Ex. 24,8), revelou-se ao Povo escolhido como único Deus verdadeiro e vivo,
em palavras e obras, de tal modo que Israel pudesse conhecer por experiência os
planos de Deus sobre os homens, os compreendesse cada vez mais profunda e
claramente, ouvindo o mesmo Deus falar por boca dos profetas, e os difundisse
mais amplamente entre os homens (cf. Sm. 21, 28-29; 95, 1-3; Is. 2, 1-4; Jr.
3,17). A “economia” da salvação de antemão anunciada, narrada e explicada pelos
autores sagrados, encontra-se nos livros do Antigo Testamento como verdadeira
palavra de Deus. Por isso, estes livros divinamente inspirados conservam um
valor perene: Tudo quanto está escrito, para nossa instrução está escrito, para
que, por meio da paciência e consolação que nos vem da Escritura, tenhamos
esperança (Rom. 15,4)”(DV 14).
A história do AT é a história de um povo, chamado povo de
Israel, judeus, hebreus “aos quais
pertencem à adoção filial, a glória, as alianças, a legislação, o culto, as
promessas, aos quais pertencem os patriarcas, e dos quais descendem o Cristo,
segundo a carne, que é acima de tudo, Deus bendito pelos séculos! Amém” (Rm
9,4)
O
lugar onde passa essa história
No livro do Gênesis, Deus faz duas
promessas a Abraão: a terra e a descendência. A caminhada dos nossos primeiros
pais é uma caminhada em busca da terra. Esse lugar antes conhecido como Canaã é
chamado na história universal como Palestina. Esse nome vem dos antigos gregos
que chamavam esse lugar assim por causa da população costeira, os filistim
(filisteus). A administração do império romano chamava a região de Judéia.
Conhecido hoje como Estado de Israel o lugar é palco de uma disputa entre
judeus e palestinos pela posse da terra.
O povo sofre várias influencias dos
povos vizinhos e a maior preocupação do Israel antigo é com a idolatria, “Não
terás outros deuses diante de mim” (Ex 20,3). Os cananeus e outros povos da
região praticam normalmente uma religião do tipo sedentário venerando deuses
locais da fertilidade chamados de báal (senhor, marido) ou mólok
(rei). Ritos de prostituição sagrada e sacrifícios humanos tornaram essas
religiões “abomináveis” aos olhos de Israel que não poucas vezes se deixaram
levar por esses costumes.
O que diferencia o povo de Israel
desses povos semitas é sua religião. Em vez dos deuses locais eles adoram um
único Deus, Javé, que caminha com o povo em toda a sua história. Os profetas
manifestam a preocupação de que Israel permaneça nesse caminho “Eu sou Javé;
não há nenhum outro” (Is 45,18c).
Os
patriarcas
A história do povo da Bíblia começa por volta de 1850
antes de Cristo. O livro do Deuteronômio, no capítulo 26,5 diz: “meu pai era um
arameu errante”. Esta confissão de fé lida e relida ao longo das gerações
recordava ao povo da Bíblia sua origem: Jacó, um arameu errante à procura de
terra, que provou do gosto amargo da escravidão no Egito. Essa recordação foi
provavelmente à semente de onde nasceu toda a experiência do povo da Bíblia, e
que animou gerações e gerações a caminhar com Deus a procura de um lugar onde
se afirme a liberdade.
Jacó, também chamado Israel, era descendente de Abraão.
Por volta de 1850 antes de Cristo, Abraão sai da Mesopotâmia e vai à procura de
um lugar onde possa viver com sua família. A promessa que Deus faz o anima pelo
caminho (Gn 12): a terra e a descendência. Essa era grande expectativa de todo
o povo seminômade. Um lugar onde pudesse se estabelecer e uma descendência,
pois os “filhos são a herança de Javé, é um salário o fruto do ventre” (Sl
127,3).
Abraão e seus descendentes, Isaac e Jacó, são conhecidos
como patriarcas, pois foram eles os pais do povo da Bíblia. Abraão foi o pai na
fé, aquele que por primeiro acreditou em Deus quando tudo a sua volta parecia
impossível.
O Novo Testamento quando faz um elogio a fé dos antepassados
não deixa de relembrar os nossos primeiros pais: “Foi pela fé que Abraão respondendo ao chamado, obedeceu e partiu para
uma terra que devia receber como herança e partiu sem saber para onde ia. Foi
pela fé que residiu como estrangeiro na terra prometida, morando em tendas com
Isaac e Jacó, os co-herdeiros da mesma promessa” (Hb 11, 8-9).
A
experiência do Êxodo como evento fundamental da fé de Israel
No final do livro das origens (Gênesis) Jacó, com sua
família chega ao Egito e passa a morar nessa região. “Chega ao trono do Egito,
um novo rei que preocupado com o povo hebreu (os hapirus, como eram
conhecidos) os submetem a duros trabalhos” (cf. Ex 1,1ss). A situação fica
muito difícil, a opressão torna a vida do povo insustentável, “então Deus ouviu
os seus gemidos; Deus lembrou-se de sua aliança com Abraão, Isaac e Jacó. Deus
viu os Israelitas e Deus se fez conhecer” (Ex 2,24-25).
Moises é o personagem que Deus escolhe para conduzir o
povo à libertação “Javé disse: ‘Eu vi a
miséria do meu povo que está no Egito. Ouvi o seu grito por cauda dos seus
opressores; pois eu conheço as suas angústias. Por isso, desci a fim de
libertá-lo da mão dos egípcios e para fazê-lo subir desta terra para uma terra
boa e vasta... Vai, pois eu te enviarei ao faraó, para fazer subir do Egito o
meu povo, os israelitas’” (Ex 3,7-12).
Este movimento de libertação, no entanto, durou um longo
tempo. Foi uma caminhada cheia de tropeços, decepções, angústias e medos, em
direção a Canaã. São muitos os que caminham e a experiência religiosa de Israel
faz Deus caminhar ao seu lado, de dia e de noite. Moisés morre antes de chegar
à terra prometida e, Josué o substitui na liderança do povo. Essa experiência
passa a constituir a pedra fundamental de toda a fé de Israel, e o eixo de todo
o Antigo Testamento.
Um
sistema de tribos
Pouco a pouco o povo hebreu vai ocupando a região de
Canaã. Os conflitos são inevitáveis. A primeira forma de organização foi em
tribos (o livro de Josué narra a entrada do povo em Canaã e a divisão da terra
entre tribos). Cada tribo era autônoma e possuía um governo próprio. O que unia
as tribos era a fé no mesmo Deus, único, que os libertou da escravidão. Esse
governo por vezes era exercido pelos juízes que procuravam por em prática um
sistema igualitário, de acordo com as leis que Deus havia dado durante a
caminhada pelo deserto (estas leis estão em Êxodo 20,1-21).
A
monarquia unida
A experiência em tribos não durou muito tempo. Samuel foi
o último dos juízes que levou adiante a organização das tribos sem um rei. Por
causa dos ataques constantes de outros povos, em 1030 as tribos do norte e do
sul decidiram que deveriam se organizar como as outras nações, tendo à sua
frente um rei. Começa então a monarquia, sendo o primeiro rei Saul. O segundo
rei foi Davi, considerado o maior rei de Israel. Ele vence as nações vizinhas,
aumenta as fronteiras do reino e escolhe Jerusalém como capital. Na época do
terceiro rei, Salomão, surge os primeiros escritos da Bíblia, que reuniam as tradições
que se transmitiam oralmente de geração em geração.
Com a monarquia aparecem também os profetas, que chamam a
atenção dos reis, das autoridades e do povo por causa da aliança que era
freqüentemente desrespeitada.
A
monarquia dividida
Quando morre o rei Salomão, em 931, as tribos
encontram-se numa situação de conflitos políticos. As tribos do norte não
querem aceitar o filho de Salomão como rei, e o reino acaba sendo dividido. As
tribos do norte formam o reino do Norte, ou Israel, com o rei Jeroboão I. O
sul, fiel a Davi e Salomão, formam o reino do Sul, ou Judá, com o rei Roboão.
As
dominações e o exílio
Durante toda a história dos reis, Israel e Judá tiveram
que lutar contra outros povos para manter a própria terra. Em 722, porém, os
assírios invadem o reino do Norte e destroem a capital, Samaria. Acaba, assim,
o reino do Norte, e os hebreus que habitavam o reino do Norte são deportados
para a Assíria.
Em 586, 150 depois, é a vez do reino do Sul. A Babilônia,
havia se tornado um forte império e tinha conquistado a Assíria. Em dois golpes
conquista a capital do reino do Sul, Jerusalém, e põe fim ao reino. Boa parte
da população é levada para a Babilônia, onde fica por 50 anos. É o tempo
conhecido como “exílio”.
A
reconstrução sob o poder estrangeiro
Em 539 a Pérsia vence a Babilônia, e o rei persa Ciro
permite que o povo judeu volte à terra de onde tinha sido tirado pelos
babilônios. Começa então a reconstrução do templo de Jerusalém, mais daí em
diante o povo de Deus nunca mais teve liberdade política, pois foi sempre
subjugado por nações estrangeiras. A esperança de reconquistar a liberdade, no
entanto, nunca morreu, e no meio do povo foi se acendendo sempre mais a
esperança de que viesse um novo libertador, um descendente de Davi, um messias
(ou seja, alguém ungido como rei) que libertasse o povo judeu do poder
estrangeiro.
Quadro histórico
Foi a
partir desse quadro histórico que foi se formando os livros da Bíblia no Antigo
Testamento. Eles são como “uma luz que ilumina os passos do povo durante toda a
sua trajetória”:
Impérios
|
As
comunidades bíblicas
Eventos
significativos
|
A
literatura bíblica
Profetas Narrativa Leis e culto Sabedoria
|
Egípcios
Assíria
Babilônia
Pérsia
Gregos
Romanos
|
1500 Israel em Canaã
e no Egito
1250
Êxodo: Moisés
1200 (Josué/Juízes) Conquista das cidades
Organização das tribos
1300
início da Monarquia
Saul rei de Israel
1010
Davi, rei de Judá e Israel
970 Salomão
Primeiro
templo
933
Cisma político
Israel (Norte) Judá (Sul)
Jeroboão I Roboão
886 Omri
875 Acab
841 Jeú 841 Atália
787 Jroboão II
781 Ozias
746 Manaém
735 Acaz
732 Oséias
722 QUEDA DE SAMARIA
Deportados 716 Ezequias
Samaritanos 640 Josias
609 Joaquim
598 Jeconias
597 Sedecias
586 Destruição do templo
Exílio da
Babilônia
EXÍLIO
PÓS-EXÍLIO 538 Volta sob
o Edito de Ciro
Segundo
templo
520 Zorobabel
JUDAÍSMO oposição dos 458 Esdras
ANTIGO samaritanos 445 Nemias
300 Cisma Samaritano/Templo
Garizim
Lágidas 167-164
Antíoco/ Macabeus
Selêucidas
Macabeus
Judas/Jonatas/Simão/João
Hasmoneus Hircano
120 destruição do
templo Garizim
Ocupação
romana
|
Sagas e
lendas
Sacrifícios/circuncisão
Moisés Êxodo Decálogo/Leis
Canto de
Mírian
Código da aliança
Samuel
Natã
Ciclo de
Davi e Salomão Liturgia do templo Salmos/Provérbios
Aías
Anais dos
reis
Elias
Eliseu
Leis da santidade
Amós
Oseías
Miquéias
Isaías
Sofonias Deuteron.
primitivo
Naum
Habacuc
Jeremias
Obra
deuteronomista
Ezequiel
2o
Isaías
Abdias
Obra
sacerdotal Rute
3o
Isaías
Ct, Jó, Pr, Ecl, Est, Dn
Ageu
Zacarias
Malaquias Torá (lei) – Gn, Ex, Lv, Nm, Dt.
Joel Profetas anteriores –
Js, Jz, Sm, Rs
Jonas
2o
Zacarias Historiografia
cronista
Tb, Sr, 2 Mc, Jt, 1 Mc,
Br, Sb
Tradução
dos LXX
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário