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domingo, 5 de maio de 2019

Uma pequena Introdução a Bíblia - Parte II



                A Bíblia é dividida em duas partes: a primeira costuma-se chamar de Antigo Testamento e a segunda de Novo Testamento.
            A palavra testamento, no hebraico Berît significa aliança, pacto; no grego diatheke, testamento, contrato. Toda a Sagrada Escritura é uma aliança entre Deus e o seu povo e essa é a melhor forma de compreender a pedagogia divina, “Tomar-vos-ei por meu povo, e serei o vosso Deus” (Ex 6,7).
            A começar pela criação, a aliança de Deus se manifesta através de toda obra criada testemunho da vontade do Criador que quer que o homem e a mulher se realizem como pessoa. Apesar do pecado de nossos primeiros pais, Deus não deixou de renovar a sua aliança através de Noé, Abraão, Isaac e Jacó, Moisés, os profetas até chegar a Jesus, Palavra de Deus, força de Deus para a salvação de toda pessoa, nova aliança e centro do Antigo e Novo Testamento. 
            As nossas traduções da Bíblia contêm sete livros a mais que as traduções protestantes. Para explicar essa diferença é preciso dizer que já antes de Cristo existiam duas versões da Bíblia do Antigo Testamento: a original de língua hebraica e uma tradução de língua grega, que era lida nas comunidades judaicas que num processo de inculturação, passaram a falar o grego. Os primeiros cristãos, na sua grande maioria, judeus de língua grega, liam as Sagradas Escrituras na tradução que ficou conhecida como Septuaginta. Todo o Novo Testamento foi escrito em grego.
No fim do séc. I, depois de expulsar os cristãos de suas sinagogas, as autoridades do Judaísmo, chegaram a um consenso e aceitaram só os livros do original hebraico. Nessa época circulava alguns livros que haviam sido escritos no grego (Jt, Tb, 1/2 Mc, Sb, Eclo e Br mais alguns fragmentos de Est e Dn) e que foram aceitos pelos cristãos como inspirados.
Por ocasião da reforma protestante, Martinho Lutero adotou a mesma linha das autoridades judaicas quanto ao AT mesmo seguindo a Bíblia grega (e latina) quanto à ordem dos livros. A justificativa católica quanto ao problema se dá porque esses sete livros faziam parte da Bíblia dos primeiros cristãos. Por causa da discussão em torno da canonicidade dos livros esses sete livros ficaram conhecidos como deuterocanônicos (aceitos como inspirados num segundo momento). O Quadro a seguir mostra os livros da Bíblia na sua totalidade:

Antigo Testamento (com base na LXX) Grifo: livros deuterocanônicos – recusados por protestantes/[grifo]: recusado por protestantes e católicos
Novo Testamento (católicos e protestantes)

Livros históricos
Gn, Ex, Lv, Nm, Dt
Js
Jz
Rt
1/2 Rs (=1/2 Sm)
3/4 Rs (= 1/2 Rs)
1/2 Paralipômenos (= 1/2 Cr)
[1 (ou 3) Esd]
2 Esd (Esd/Ne)
Est (+ fragmentos deuterocanônicos 10,4-16,24)
Jt
Tb
1/2 Macabeus
[3/4 Macabeus]
Livros sapienciais
Sl
[Odas]
Pr
Ecl
Ct
Sb
Sr
[Salmos de Salomão]



Livros proféticos
Is
Jr
Lm
Br/carta de Jeremias
Ez
Dn (+ fragmentos deuterocanônicos 13-14)
12 profetas menores
Os, Am, Mq, Jl, Ab, Jn, Na, Hab, Sf, Ag, Zc, Ml
Evangelhos e Atos
Mt, Mc, Lc, Jo
Cartas Paulinas
Rm, 1/2 Cor, Gl, Ef, Fl, Cl, 1/2 Tm, Tt, Fm, Hb
Cartas Católicas
Tg, 1/2 Pd, 1/2/3 Jo, Jd
Apocalipse



A Bíblia judaica (que nos chamamos de Antigo Testamento) possue 24 livros divididos em três grupos:
T – Torá, a lei (de Moisés);
N – Nebiîm, os profetas:
 - anteriores;
 - posteriores;
k – Ketubîm, os escritos.

O Antigo Testamento

“Deus amantíssimo, desejando e preparando com solicitude a salvação de todo o gênero humano, escolheu por especial providência um povo a quem confiar as suas promessas. Tendo estabelecido aliança com Abraão (cf. Gn. 15,18), e com o povo de Israel por meio de Moisés (cf. Ex. 24,8), revelou-se ao Povo escolhido como único Deus verdadeiro e vivo, em palavras e obras, de tal modo que Israel pudesse conhecer por experiência os planos de Deus sobre os homens, os compreendesse cada vez mais profunda e claramente, ouvindo o mesmo Deus falar por boca dos profetas, e os difundisse mais amplamente entre os homens (cf. Sm. 21, 28-29; 95, 1-3; Is. 2, 1-4; Jr. 3,17). A “economia” da salvação de antemão anunciada, narrada e explicada pelos autores sagrados, encontra-se nos livros do Antigo Testamento como verdadeira palavra de Deus. Por isso, estes livros divinamente inspirados conservam um valor perene: Tudo quanto está escrito, para nossa instrução está escrito, para que, por meio da paciência e consolação que nos vem da Escritura, tenhamos esperança (Rom. 15,4)”(DV 14).


            A história do AT é a história de um povo, chamado povo de Israel, judeus, hebreus “aos quais pertencem à adoção filial, a glória, as alianças, a legislação, o culto, as promessas, aos quais pertencem os patriarcas, e dos quais descendem o Cristo, segundo a carne, que é acima de tudo, Deus bendito pelos séculos! Amém” (Rm 9,4)

O lugar onde passa essa história

            No livro do Gênesis, Deus faz duas promessas a Abraão: a terra e a descendência. A caminhada dos nossos primeiros pais é uma caminhada em busca da terra. Esse lugar antes conhecido como Canaã é chamado na história universal como Palestina. Esse nome vem dos antigos gregos que chamavam esse lugar assim por causa da população costeira, os filistim (filisteus). A administração do império romano chamava a região de Judéia. Conhecido hoje como Estado de Israel o lugar é palco de uma disputa entre judeus e palestinos pela posse da terra.
            O povo sofre várias influencias dos povos vizinhos e a maior preocupação do Israel antigo é com a idolatria, “Não terás outros deuses diante de mim” (Ex 20,3). Os cananeus e outros povos da região praticam normalmente uma religião do tipo sedentário venerando deuses locais da fertilidade chamados de báal (senhor, marido) ou mólok (rei). Ritos de prostituição sagrada e sacrifícios humanos tornaram essas religiões “abomináveis” aos olhos de Israel que não poucas vezes se deixaram levar por esses costumes.
            O que diferencia o povo de Israel desses povos semitas é sua religião. Em vez dos deuses locais eles adoram um único Deus, Javé, que caminha com o povo em toda a sua história. Os profetas manifestam a preocupação de que Israel permaneça nesse caminho “Eu sou Javé; não há nenhum outro” (Is 45,18c).

Os patriarcas

            A história do povo da Bíblia começa por volta de 1850 antes de Cristo. O livro do Deuteronômio, no capítulo 26,5 diz: “meu pai era um arameu errante”. Esta confissão de fé lida e relida ao longo das gerações recordava ao povo da Bíblia sua origem: Jacó, um arameu errante à procura de terra, que provou do gosto amargo da escravidão no Egito. Essa recordação foi provavelmente à semente de onde nasceu toda a experiência do povo da Bíblia, e que animou gerações e gerações a caminhar com Deus a procura de um lugar onde se afirme a liberdade.
            Jacó, também chamado Israel, era descendente de Abraão. Por volta de 1850 antes de Cristo, Abraão sai da Mesopotâmia e vai à procura de um lugar onde possa viver com sua família. A promessa que Deus faz o anima pelo caminho (Gn 12): a terra e a descendência. Essa era grande expectativa de todo o povo seminômade. Um lugar onde pudesse se estabelecer e uma descendência, pois os “filhos são a herança de Javé, é um salário o fruto do ventre” (Sl 127,3).   
            Abraão e seus descendentes, Isaac e Jacó, são conhecidos como patriarcas, pois foram eles os pais do povo da Bíblia. Abraão foi o pai na fé, aquele que por primeiro acreditou em Deus quando tudo a sua volta parecia impossível.
            O Novo Testamento quando faz um elogio a fé dos antepassados não deixa de relembrar os nossos primeiros pais: “Foi pela fé que Abraão respondendo ao chamado, obedeceu e partiu para uma terra que devia receber como herança e partiu sem saber para onde ia. Foi pela fé que residiu como estrangeiro na terra prometida, morando em tendas com Isaac e Jacó, os co-herdeiros da mesma promessa” (Hb 11, 8-9).

A experiência do Êxodo como evento fundamental da fé de Israel

            No final do livro das origens (Gênesis) Jacó, com sua família chega ao Egito e passa a morar nessa região. “Chega ao trono do Egito, um novo rei que preocupado com o povo hebreu (os hapirus, como eram conhecidos) os submetem a duros trabalhos” (cf. Ex 1,1ss). A situação fica muito difícil, a opressão torna a vida do povo insustentável, “então Deus ouviu os seus gemidos; Deus lembrou-se de sua aliança com Abraão, Isaac e Jacó. Deus viu os Israelitas e Deus se fez conhecer” (Ex 2,24-25).
            Moises é o personagem que Deus escolhe para conduzir o povo à libertação “Javé disse: ‘Eu vi a miséria do meu povo que está no Egito. Ouvi o seu grito por cauda dos seus opressores; pois eu conheço as suas angústias. Por isso, desci a fim de libertá-lo da mão dos egípcios e para fazê-lo subir desta terra para uma terra boa e vasta... Vai, pois eu te enviarei ao faraó, para fazer subir do Egito o meu povo, os israelitas’” (Ex 3,7-12).
            Este movimento de libertação, no entanto, durou um longo tempo. Foi uma caminhada cheia de tropeços, decepções, angústias e medos, em direção a Canaã. São muitos os que caminham e a experiência religiosa de Israel faz Deus caminhar ao seu lado, de dia e de noite. Moisés morre antes de chegar à terra prometida e, Josué o substitui na liderança do povo. Essa experiência passa a constituir a pedra fundamental de toda a fé de Israel, e o eixo de todo o Antigo Testamento.

Um sistema de tribos

            Pouco a pouco o povo hebreu vai ocupando a região de Canaã. Os conflitos são inevitáveis. A primeira forma de organização foi em tribos (o livro de Josué narra a entrada do povo em Canaã e a divisão da terra entre tribos). Cada tribo era autônoma e possuía um governo próprio. O que unia as tribos era a fé no mesmo Deus, único, que os libertou da escravidão. Esse governo por vezes era exercido pelos juízes que procuravam por em prática um sistema igualitário, de acordo com as leis que Deus havia dado durante a caminhada pelo deserto (estas leis estão em Êxodo 20,1-21).

A monarquia unida

            A experiência em tribos não durou muito tempo. Samuel foi o último dos juízes que levou adiante a organização das tribos sem um rei. Por causa dos ataques constantes de outros povos, em 1030 as tribos do norte e do sul decidiram que deveriam se organizar como as outras nações, tendo à sua frente um rei. Começa então a monarquia, sendo o primeiro rei Saul. O segundo rei foi Davi, considerado o maior rei de Israel. Ele vence as nações vizinhas, aumenta as fronteiras do reino e escolhe Jerusalém como capital. Na época do terceiro rei, Salomão, surge os primeiros escritos da Bíblia, que reuniam as tradições que se transmitiam oralmente de geração em geração.
            Com a monarquia aparecem também os profetas, que chamam a atenção dos reis, das autoridades e do povo por causa da aliança que era freqüentemente desrespeitada.

A monarquia dividida

            Quando morre o rei Salomão, em 931, as tribos encontram-se numa situação de conflitos políticos. As tribos do norte não querem aceitar o filho de Salomão como rei, e o reino acaba sendo dividido. As tribos do norte formam o reino do Norte, ou Israel, com o rei Jeroboão I. O sul, fiel a Davi e Salomão, formam o reino do Sul, ou Judá, com o rei Roboão.

As dominações e o exílio

            Durante toda a história dos reis, Israel e Judá tiveram que lutar contra outros povos para manter a própria terra. Em 722, porém, os assírios invadem o reino do Norte e destroem a capital, Samaria. Acaba, assim, o reino do Norte, e os hebreus que habitavam o reino do Norte são deportados para a Assíria.
            Em 586, 150 depois, é a vez do reino do Sul. A Babilônia, havia se tornado um forte império e tinha conquistado a Assíria. Em dois golpes conquista a capital do reino do Sul, Jerusalém, e põe fim ao reino. Boa parte da população é levada para a Babilônia, onde fica por 50 anos. É o tempo conhecido como “exílio”.

A reconstrução sob o poder estrangeiro

            Em 539 a Pérsia vence a Babilônia, e o rei persa Ciro permite que o povo judeu volte à terra de onde tinha sido tirado pelos babilônios. Começa então a reconstrução do templo de Jerusalém, mais daí em diante o povo de Deus nunca mais teve liberdade política, pois foi sempre subjugado por nações estrangeiras. A esperança de reconquistar a liberdade, no entanto, nunca morreu, e no meio do povo foi se acendendo sempre mais a esperança de que viesse um novo libertador, um descendente de Davi, um messias (ou seja, alguém ungido como rei) que libertasse o povo judeu do poder estrangeiro.

Quadro histórico

Foi a partir desse quadro histórico que foi se formando os livros da Bíblia no Antigo Testamento. Eles são como “uma luz que ilumina os passos do povo durante toda a sua trajetória”:

Impérios
As comunidades bíblicas
Eventos significativos
A literatura bíblica
Profetas        Narrativa        Leis e culto            Sabedoria

Egípcios


















Assíria






Babilônia




Pérsia





Gregos





Romanos 


  1500                        Israel em Canaã e no Egito
  1250                                          Êxodo: Moisés
 1200 (Josué/Juízes)                Conquista das cidades
                                                     Organização das tribos
 1300                                           início da Monarquia
                                                     Saul rei de Israel
1010                                           Davi, rei de Judá e Israel
970                                             Salomão
Primeiro templo
933                                           Cisma político
                     Israel (Norte)                       Judá (Sul)
                     Jeroboão I                            Roboão
             886 Omri
            875 Acab
           841 Jeú                                   841 Atália
          787 Jroboão II   
                                                           781 Ozias
         746 Manaém
                                                          735 Acaz
        732 Oséias
       722 QUEDA DE SAMARIA
               Deportados                    716 Ezequias
               Samaritanos                   640 Josias
                                                        609 Joaquim                         
                                                       598 Jeconias
                                                      597 Sedecias
                                                      586 Destruição do templo
                                                              Exílio da Babilônia
EXÍLIO

PÓS-EXÍLIO                                538 Volta sob o Edito de Ciro
Segundo templo
                                                   520 Zorobabel
JUDAÍSMO   oposição dos     458 Esdras
ANTIGO        samaritanos      445 Nemias
300                   Cisma Samaritano/Templo Garizim
Lágidas                               167-164 Antíoco/ Macabeus
Selêucidas
Macabeus            Judas/Jonatas/Simão/João                                                
Hasmoneus                     Hircano
                      120 destruição do templo Garizim
Ocupação romana
                                 
                      Sagas e lendas                Sacrifícios/circuncisão
 Moisés                     Êxodo                               Decálogo/Leis
                                  Canto de Mírian
                                                                             Código da aliança
Samuel

Natã
                                 Ciclo de Davi e Salomão Liturgia do templo                 Salmos/Provérbios

Aías
                                 Anais dos reis
Elias
Eliseu                                                                  Leis da santidade


Amós
Oseías



Miquéias
Isaías
Sofonias                                                         Deuteron. primitivo
Naum
Habacuc
Jeremias



                                   Obra deuteronomista
Ezequiel
2o Isaías
Abdias
                                  Obra sacerdotal                                                       Rute
3o Isaías                                                                                                      Ct, Jó, Pr, Ecl, Est, Dn
Ageu                                                                                                                                  
Zacarias
Malaquias           Torá (lei) – Gn, Ex, Lv, Nm, Dt.
Joel                      Profetas anteriores – Js, Jz, Sm, Rs
Jonas
2o Zacarias          Historiografia cronista                                         Tb, Sr, 2 Mc, Jt, 1 Mc, Br, Sb
Tradução dos LXX






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