"Passaram
por Anfípolis e Apolônia e chegaram a Tessalônica, onde havia uma sinagoga de
judeus" (At 17,1).
Na
segunda viagem missionária (49-52 d.C.), Paulo atravessou a província da Ásia
(a atual Turquia) e chegou à cidade de Filipos, na província da Macedônia
(atualmente Grécia meridional), por volta do ano 50 d.C. Esse foi o início de
sua missão na Europa. Apesar de todas as dificuldades (Cf.1Ts 2,2a), eles
continuavam anunciado a boa nova da salvação formando novas comunidades como entrevemos
na saudação do apóstolo, “Paulo, Silvano e Timóteo à igreja dos
Tessalonicenses, reunida em Deus Pai e no Senhor Jesus Cristo” (1 Ts 1,1).
Como
é que se forma uma comunidade? Através da força do Espírito Santo, somos atraídos até
Jesus e passamos a nos reunir em torno da sua Palavra. “Não se começa a ser
cristão por uma decisão ética ou uma grande ideia, mas mediante um encontro com
um acontecimento, com um uma pessoa que dá um novo horizonte a vida e, com
isso, uma orientação decisiva” (DA 243). Por isso, se faz necessário “quem
pregue” (Cf. 1 Cor 10,14ss), que o anúncio seja permanente para que esse
encontro decisivo aconteça.
Quando esse encontro
acontece, vidas são transformadas pela força do Espírito Santo, homens e
mulheres passam a seguir aquela voz que ressoa em todos os cantos criando uma
realidade marcada pela presença do ressuscitado. Devemos acrescentar que esse
encontro com Jesus “provoca uma conversão de vida, que leva ao discipulado,
gera comunidade e impele a sair em missão” (DA 278).
Paulo
e Silas passaram meses testemunhando a boa nova da salvação. Nossas comunidades
começam com um forte impulso carismática que nos empurra a testemunhar cada vez
mais o amor que nos une e reúne em torno do Cristo que vive. O Evangelho se
torna vivo e muitos vão se agregando a nossas comunidades, o que provoca uma efervescência
entre nós. A comunidade reunida se torna palavra profética.
A comunidade é formada
por quem segue e por quem professa a fé. O seguimento vem do encontro com o
Cristo ressuscitado. Foi esse encontro que fez o apostolo Paulo deixar tudo
para trás para correr atrás do conhecimento de Cristo, seu bem supremo (Cf. Fl
3,8). Esse encontro nasce da proclamação dos crentes que pregam com ou sem
palavras despertando a fé nos que veem e ouvem. Depois essa fé se torna
testemunho no lugar em que vivemos, porque esse “Jesus que chama é o mesmo que
envia. Ele chama para estar consigo e para sair em missão. Por isso não se pode
separar a vida em comunidade da ação missionaria, como se uma só dessas
dimensões bastasse” (DGAE 18). Não foi isso que Paulo e seus companheiros
fizeram? Não foi isso que despertou a fé, sendo o ponta pé inicial de novas
comunidades?
Não podemos abdicar nosso
status missionário. O que percebemos muitas vezes em nossas comunidades é que o
ardor vai diminuindo e vamos nos enrolando com reuniões e mais reuniões,
burocratizando cada vez mais a vida comunitária pondo nossos esforços na
“pastoral de conservação”. O espírito Santo continua interpelando as
comunidades a não abandonar sua raiz fundante. Do seu jeito próprio, no lugar
em que foram enraizadas devem proclamar que Cristo está vivo. Mesmo com todas
as dificuldades que enfrentamos devemos permanecer com ouvidos bem abertos para
escutar o Senhor que diz: “IDE”.
Depois que os apóstolos foram expulsos
de Filipos, eles seguiram para o oeste, pela via Egnatia, a grande estrada
romana que ligava Roma com as províncias do Oriente, fazendo conexão com
importantes estradas, como a via Ápia (vinda de Roma). Depois de uma jornada de
cerca de 150 quilômetros, Paulo e Silas chegaram à cidade de Tessalônica
(atualmente Salônica, Grécia), capital da província da Macedônia. Uma das
cidades mais movimentadas e prósperas do Império Romano no século I.
O
cristianismo paulino foi preferencialmente, um fenômeno urbano.[1] Um dos desafios que
vivemos hoje é a cultura urbana. Ontem e hoje somos chamados a ler a realidade
que nos cerca para transformar pela força do Evangelho: “Quando a Igreja fala
em evangelização da cultura urbana, tem clareza de que ‘não se trata tanto de
pregar o Evangelho a espaços geográficos cada vez mais vastos ou populações
maiores em dimensões de massa, mas de chegar a atingir e como que a modificar
pela força do Evangelho os critérios de julgar, os valores que contam, os
centros de interesse, as linhas de pensamento, as fontes inspiradoras e os
modelos de vida da humanidade, que se apresentam em contraste com a Palavra de
Deus e com o desígnio da salvação’” (DGAE 31).
Fé
e cultura sempre se entrelaçaram. Como nossas comunidades têm iluminado a
cultura urbana? Como essa cultura tem mudado a rotina de nossas comunidades?
Devido
a localização privilegiada de Tessalônica a cidade presenciava uma grande circulação
de indivíduos vindo de todos os lugares interessados em fazer negócios e
explorar as riquezas do lugar. As informações históricas atestam, entre a
população grega da cidade, a presença de vários povos: egípcios, trácios (povo
indo-europeu), ítalos (da antiga Itália), sírios, judeus, entre outros. Por
isso, podemos dizer que não só mercadorias circulavam mais ideias, crenças,
medos, preconceitos, lendas, histórias e mitos que provocavam uma enorme
pluralidade.
Essa
pluralidade se verificava também nas crenças religiosas. Além dos cultos locais
e das divindades do Olimpo grego (Zeus, Apoio, Ares, Afrodite, Dionísio etc.),
a presença de cultos às divindades “estrangeiras” é bem atestada em
Tessalônica: cultos romanos com suas divindades (Júpiter, Febo, Martes, Vênus
etc.), culto obrigatório ao imperador (salvador e messias), divindades egípcias
(Serápis, Osíris, Anúbis), asiáticas (Átis e Cibele) . O judaísmo tinha o seu
espaço já que gozava de licitude por parte das autoridades. Também não faltavam
novas religiões de mistérios, vindas do Oriente. Seus pregadores circulavam
pelas ruas da cidade, vendendo o “êxtase espiritual”. Um verdadeiro mercado
religioso!
Se
olhamos para “as Tessalônicas” de hoje, vemos a mesma pluralidade em todos os
cantos. Um simples olhar ao nosso redor atesta isso. O mercado de ideias,
crenças, ídolos, mitos, ritos, estão em todo lugar tornando desafiador a vida
em comunidade. Um emaranhado de fios precisa ser desenrolado em nossas
comunidades graças ao progresso técnico-cientifico, opções de entretenimento,
alcance dos meios de comunicação, circulação de ideologias, alternativas religiosas,
desigualdades sociais, o que nos obriga a examinar o quanto não estamos sendo
estrangulados por esses fios visíveis e invisíveis que por vezes, são difíceis
de quebrar.
Quem
chega em nossas comunidades vem pelas inúmeras estradas existenciais, virtuais e
conflitivas que se criaram no meio em que vivemos. Elas trazem consigo sonhos,
esperanças, planos, projetos, derrotas, fracassos, tristezas, magoas...enfim, eles
não vêm de mãos vazias. Alguns carregam histórias que podem ser contadas, outras
preferirem esconder ou até mesmo mudar, mentindo, enganando a si mesmo e aos
outros. Eles já viram e ouviram muito ao longo da sua trajetória de vida e não
sabemos o quanto isso os tem afetado. Mas, o Cristo itinerante, os achou pelo
caminho e disse, “vinde e vede”. Portanto, nossas comunidades devem estar de
portas abertas para acolher quem chega, preparadas para cuidar, sendo igreja samaritana
(Cf. Lc 10,30-37).
“Alguns deles creram e associaram-se
a Paulo e Silas, como também uma grande multidão de prosélitos gentios, e não
poucas mulheres de destaque” (At 17,4).
Nenhum comentário:
Postar um comentário