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quarta-feira, 28 de agosto de 2019

Cada comunidade é uma obra de Deus


“Não cessamos de dar graças a Deus por todos vós, e de lembrar-vos em nossas orações” (1Ts 1,2).

Existe entre nós um parentesco espiritual estabelecido por vínculos que “águas torrenciais jamais poderão apagar” (Cf. Ct 8,7), porque é o amor que o fortalece ao longo da convivência. Um alcoólatra começou a participar da nossa comunidade. Ele vinha com muita frequência. E um dia, ele me confidenciou que por causa da acolhida que recebeu passou-se a sentir em casa, como se fossemos sua família. Esse exemplo ilustra bem o que nossas comunidades devem ser: uma casa de acolhida para os irmãos e irmãs. 

Como é o amor quem fortalece nossos vínculos espirituais, podemos faze-los crescer através da oração. A caridade evangélica é perfeitamente exercida quando nos propomos a orar uns pelos outros. Sem nos darmos conta nos aproximamos daqueles que estão em nossas orações e isso cria um nó espiritual que não se quebra tão facilmente sustentando assim, os fortes e os fracos. A oração pelos nossos irmãos e irmãs nos ajuda a vencer o egoísmo que insiste em nos fazer esquecer de quem se uniu a nós pelos laços da fé. Cria-se uma solidariedade espiritual capaz de nos curar da cegueira que nos impede de ver o outro.

Por que estou insistindo nisso? Muitas vezes quem chega em nossas comunidades tem suas próprias preocupações. E ora continuamente para que Deus atenda suas necessidades materiais e espirituais. Mas, só quem fica, quem persevera, é quem passa a se preocupar com os outros. Na verdade, quem atravessa o limiar do eu para o nós passa a se sentir parte da família. Quem fica no eu pode até continuar, porém, vai atrapalhar muito a vida dos que passam a pertencer a essa nova família por causa da sua indiferença, egoísmo e insensibilidade. O que fazer então com esses que não atravessam esse limiar? Orar! Porque é fazendo essa travessia que chegaremos ao céu.
A decisão de viver em comunidade é uma resposta a pergunta que Jesus mesmo faz e que ele mesmo respondeu: “todo aquele que faz a vontade do meu Pai que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (Mt 12,50).
No vs. 3, o Apostolo Paulo relaciona as virtudes teologias, fé, esperança e caridade as obras, a firmeza e aos sacrifícios, respectivamente.
Podemos dizer que a comunidade, por si só, é uma grande obra. Deus não levanta uma comunidade, se não para ser uma grande obra. Essa é a nossa certeza. Não podemos nos confundir achando que ser uma grande obra é ser uma grande comunidade, numerosa, espalhada por vários lugares, reconhecida por todos. Uma comunidade que se transforma em uma grande obra é aquela que se alegra com o que é e procura ser aquilo que O Espírito Santo a chamou a ser. O segredo é saber o que Deus chamou a ser. Devemos seguir as pistas para descobrir.
Santa Teresinha nos dá uma valiosa lição nesse sentido através da Parábola das flores do jardim. Diante de suas inquietações ela reconhece que todas as flores são belas e exalam o seu cheiro, mais nem todas são lírios ou rosas, algumas são violetas e malmequer. Compreendeu então que "se todas as florzinhas quisessem ser rosas, a natureza perderia sua gala primaveril, não haveria mais campos esmaltados de pequenas flores". E concluiu: "Dá-se o mesmo no mundo das almas, que é o jardim de Jesus. Quis Ele criar os grandes santos, os quais podem comparar-se aos lírios e às rosas; mas criou também os menores, e estes devem contentar-se em ser malmequeres ou violetas, destinados a deleitar os olhos do Bom Deus, quando os sujeita a seus pés. A perfeição consiste em fazer sua vontade, em ser o que Ele quer que sejamos".
Essa parábola pode ser interpretada por nós. Basta olhar e ver que no jardim de Deus existem grandes e pequenas comunidades. Algumas tem conseguido expandir seus ramos em tantos lugares e outras que ficam circunscritas a paróquia onde nasceram. Algumas atuam em tantas áreas que acabam ganhando notoriedade, outras desempenham um trabalho que nem sempre é reconhecido. Mas, não é isso que faz o jardim da Igreja ser tão bonito? Reconheçamos o nosso valor e façamos a vontade de Deus sendo aquilo que fomos chamados a ser. Poderemos nos perder se quisermos ser o que Deus chamou o outro a ser, entendem? Não podemos usurpar o que foi dado a outro! Ao contrário, devemos nos alegrar com o que foi dado a nós e aos outros, nos beneficiando dos dons que foram repartidos pelo próprio como lhe aprouve.
Grandes obras precisam de homens e mulheres firmes. Jesus uma vez contou uma parábola da casa edificada na rocha (Cf. Mt 7,24. Chuvas, ventos fortes e enchentes não podem derruba-la porque ela está firme. O Mestre nessa parábola também nos alerta que se a casa não estiver bem edificada será grande a sua ruína. Agora imagine que essa casa seja a sua comunidade. Ela pode está bem edificada ou não. Se sim, ela ficará firme quando sobrevierem as dificuldades, os conflitos, perseguições, disputas, intrigas, calunias ou difamações. Essa firmeza vem da esperança que não engana (Cf. Rm 5,5) que associada a fé que nos move nos torna fortes nas lutas que teremos que travar para permanecermos juntos.
Quanto mais o Espírito Santo nos conduz ao aprofundamento da vida em comunidade, mais firmes ficaremos. E para que isso aconteça devemos fazer sacrifícios. Esses sacrifícios são uma prova de amor dada por quem se descobriu amado e quer, responder ao amor com amor. Dizendo de um outro jeito, quando decidimos viver em comunidades temos que aprender a fazer os sacrifícios diários da vida espiritual. São Lucas nos diz que as primeiras comunidades eram assíduas ao ensinamento dos apóstolos, a fração do pão e as orações (Cf. At 2,42). Isso não exigia nada deles? Claro que sim, ainda mais quando recordamos o contexto de instabilidade que marcava essas comunidades nascentes.
Oseias fala de um sacrifício que vem dos nossos lábios (Cf. Os 14,2). Um sacrifício com cânticos de louvor é o que oferece Jonas (Cf. Jn 2,10). São Paulo nos diz que nós devemos progredir no amor, por causa do exemplo de Cristo, “que nós amou e por nós se entregou a Deus como oferenda e sacrifício de agradável odor” (Ef 5,2). Qualquer pai ou mãe que exerça bem o seu papel consegue dizer o que é sacrifício e acredita que todo o esforço não é em vão. Nós que aceitamos viver nessa nova família espiritual sabemos que os sacrifícios são inúmeros: regra, reuniões, missões, orações, leituras, estudos, compromissos. O sacrifício é o da vida toda doada por causa do amor que nos conquistou. É um sacrifício regado pelo Espírito Santo que transforma as horas em instantes transformadores, os suores e lágrimas em água viva, que lançado no chão da vida faz crescer novas esperanças.

“Sabemos irmãos amados de Deus, que sois eleitos” (1 Ts 1,4).



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