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segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

O encontro dos amigos

 

Moisés recebe esse nome porque foi tirado das águas. Águas manchadas com as lágrimas de tantas mulheres que choraram a morte de seus filhos ou que amargavam a opressão que sofriam todos os dias.  Águas que tornavam a terra fértil, boa para o plantio, mas que não alimentavam a todos da mesma forma. Águas que recordavam ao povo hebreu, histórias de dilúvios que mesmo trazendo lembranças de destruição, carregavam também, sinais de esperança, porque alguns poucos sobreviveram, aqueles que entraram na Arca construída por Noé.  Muito tempo depois, outras águas banham o Filho de Deus, o novo Moisés, e agora passa a ser sinal de regeneração dos filhos de Deus (Cf. Rm 8, 15; Gal 4, 5-7; Tt 3,5). Das águas do Nilo vem a salvação do povo cativo no Egito, das águas do Jordão, que Cristo santificou, vem a salvação de todo o gênero humano!

Das águas vem aquele que vai guiar o povo por entre as águas em uma caminhada para a liberdade. Moisés cresceu e tomou partido pelo povo que ele não conhecia tão bem. Sabia que eles eram explorados, tomou partido e teve que partir porque já não era mais bem vindo. Foi a beira de um poço (Cf. Ex 2,15-16) que um novo momento de sua história se deu. Mais uma vez ele toma partido e dessa vez é bem-vindo na casa de Raguel, pai daquela que viria a se tornar sua esposa.

Aos poucos, aquela criança tirada das águas vai descobrindo sua vocação. No meio de uma teofania, Deus se revela a Moisés dizendo: "Eu vi, ouvi...desci para libertar o meu povo...". Esses verbos demonstram a ação de Deus que se preocupa com o destino do seu povo. A sua vocação está relacionada a missão a qual Deus o chama. E que missão! Ele reluta, sabe das enormes dificuldades que vai enfrentar. Acontece uma espécie de negociação e Deus vence. Moisés aceita a missão.

Não podemos deixar de dizer que todos temos um chamado, uma missão que cresce no chão da vida, lugar sagrado, que Deus rega através do Espírito Santo. Assim como Moisés, vamos descobrindo ao longo do tempo o que significa “vocação” e quanto mais amigos de Deus nos tornamos, percebemos a força irresistível do seu chamado. Não somos tirados das águas, mas sim, mergulhados pelo nosso Batismo que faz jorrar em nosso interior “rios de água viva” (Cf. Jo 7,37).

Vejam que essa última imagem nos lembra, algo abundante, “rios de água viva’, isso porque aquilo que Deus quer fazer é salvar o seu povo. De mim, de você, jorra uma água. Somos apenas um poço. Já bebemos da água de tantos que deram a vida por causa do Evangelho, Pedro e Paulo, Barnabé, Inácio, Agostinho, Antônio, Francisco, Teresa, Teresinha... deles ainda jorram água, porque suas vidas se transformaram em um exemplo. Com eles, a quem chamamos de santos, aprendemos a ir sempre ao encontro de poços que jorram água da vida, ou seja, a beber do testemunho deles que doaram suas vidas pelo Reino de Deus.

Deus precisa de mim e de você, Ele precisa de nós para que sua missão salvadora se realiza no aqui e agora da história. Não podemos nos tornar uma cisterna rachada (Cf. Jr 2,9-13) que não retêm água! Para que isso não aconteça devemos ser "amigos de Deus" como Moisés foi deixando que a água jorre abundantemente. Devemos reter essa água viva como um poço. O poço era um lugar de encontro porque ali se apanhava água. Jesus se encontrou com a Samaritana a beira de um poço (Cf. Jo 4) e esse diálogo revela a necessidade de “pedir a água da vida”. Hoje é você e Jesus. O poço é o seu coração. Ore, e deixe esse poço cheio de água. Depois vai ser você e o próximo, dois poços, uma só água. Bebam!  

 

 

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

Moisés, nascido das águas

 Naqueles dias, um homem da família de Levi tomou como esposa uma jovem da mesma tribo. A mulher concebeu e deu à luz um filho e, vendo como era belo, escondeu-o durante três meses. Como não podia mantê-lo oculto por mais tempo, arranjou uma cesta de papiro, calafetou-a com betume e pez, meteu nela o menino e colocou-a entre os juncos, à beira do Rio, enquanto a irmã dele se postava a certa distância, para ver o que iria acontecer-lhe. 

Ora a filha do faraó desceu ao Rio para se banhar, enquanto as suas damas de companhia passeavam ao longo da margem. Então ela avistou a cesta no meio dos juncos e mandou a uma serva que a fosse buscar. Abriu-a e viu a criança: era um menino a chorar. Teve pena dele e exclamou: «É um filho de hebreus». A irmã dele disse à filha do faraó: «Queres que eu vá procurar, entre as mulheres hebreias, uma ama para criar este menino?».«Vai.», respondeu-lhe a filha do faraó.

E a jovem foi chamar a mãe da criança. Disse-lhe a filha do faraó: «Leva este menino, a fim de o criares para mim, e eu própria te darei o teu salário». Então a mulher levou a criança e amamentou-a. Quando o menino cresceu, trouxe-o à filha do faraó, que o adoptou como filho e lhe deu o nome de Moisés, dizendo: «Salvei-o das águas». (Êxodo 2,1-6) 


Moisés nasce em uma realidade de sofrimento do seu povo. As crianças eram assassinadas, os mais jovens submetidos a trabalhos forçados e todos viam a liberdade com algo distante. Moisés nasce e é escondido, só que chegou a hora que não podendo mais esconde-lo, ele foi colocado dentro um cesto e posto nas margens do Rio Nilo (Cf. Ex 2,3). O curso providencial da mão de Deus fez com que as águas empurrassem o cesto até a filha do Faraó que imediatamente quis adotar essa criança hebreia. A irmã de Moisés acompanhava o cesto de longe, e quando viu o que aconteceu ofereceu seus serviços indo buscar uma mãe para amamentar aquele recém-nascido. O que é cômico no meio dessa enorme aflição é que, a mãe de Moisés tem novamente seu filho nos braços e ainda recebe um salário para fazer aquilo que outrora ela fazia sem nada em troca.  

  A história de Moisés, a criança “tirada das águas” é o começo do começo. Contemplamos com desgosto a opressão que abate o povo os transformando em “oprimidos”. Mas, ele sobrevive ao infortúnio da violência do Estado e vai ao longo do tempo compreendendo a escolha que Deus fez para libertar o seu povo da opressão. Ele foi chamado e diante dos enormes desafios, responde sim, e aquilo que era desgraça, da lugar a graça, a adversidade passa a ser oportunidade! 

Gostaria de brevemente fazer um elogio a mãe de Moisés. Ao ter essa criança, ela sabia que a alegria poderia se transformar em luto, mas mesmo assim, arriscou, porque “escolheu a vida e não a morte”. Diante da desumanidade que perseguia o seu povo, preferiu a humanidade. Ela cuida, protege e ama aquele menino sem saber o que o amanhã reserva. Ela é um sinal de esperança para muitos que se entregam ao desespero por causa da violência que espreita a porta de casa, ou que até mesmo, atinge, machucando quem passa a sofrer a dor, sem muitas vezes saber o que fez para merecer isso.

A violência é o rosto sombrio, perverso e indigesto da desumanidade. Existe esperança quando estamos diante da violência? sim, existe! A violência não tem a última palavra, e sim a paz que ecoa como um coral de vozes cujas palavras ressoam num som harmonioso. Ao longo da vida somos tentados a umedecer o canto da paz, dando voz a violência que grita querendo atenção. Fechemos os ouvidos a essa gritaria infernal e ouçamos o som da criação que sobe no palco do universo sendo ouvida em todos os cantos da casa comum. Aplaudamos cada criança que nasce pois ela esconde uma composição que o próprio Deus inscreveu em sua alma! Saudemos eufóricos a música de quem perdoou ou daqueles que passaram a se enxergar com compaixão. Toquemos o instrumento confeccionado pela madeira semelhante à da Cruz que em suas notas repetem a necessidade de amar com o mesmo amor com que Cristo nos amou.